Chaves com sua ingenuidade e uma certa dose de crítica – por vezes meio camuflada -, ganhou um universo de fãs que o idolatram, relembram e acompanham, mesmo que através de reprises intermináveis e eternas. Chaves ganhou espaço aqui no Minha Memória de Séries. Quem nunca imaginou o que Chaves tem dentro do barril? Com certeza você já se pegou falando a famosa frase: “foi sem querer, querendo”! É claro que você já conferiu as aventuras desta turminha na vila.
Mais do que uma série, Chaves é um fenômeno. Exibida no Brasil pelo SBT desde 1984, é uma das principais armas da emissora para ganhar pontos de audiência. E só sendo um fenômeno para permanecer há mais de 30 anos no ar com reprise constante de episódios, piadas que todos já conhecem, mas que não perderam a graça mesmo após esse período. Um humor que não é apelativo e que também não é banal e muito menos infantil.
No México, o seriado Chaves (chamado de El Chavo del Ocho por lá) passou por três fases. Em 1971 e 1972 era veiculado no canal TIM dentro do programa Chespirito, que incluia pequenos capítulos de Chapolin Colorado, outra criação de Roberto Bolãnos, além também do Dr. Chapatin e outras esquetes cômicas sem personagens fixos. No ano seguinte, Chaves ganhou uma série própria de 30 minutos na Televisa que durou até 1979. Depois disso, Chespirito voltaria a ser produzido em 1980 até finalmente acabar em 1995. Todavia, Chaves havia parado de fazer parte do programa Chespirito desde 1992.
No ar há mais de quatro décadas, seu enredo não exige quase nada do telespectador e ganha fãs a cada geração. Seu humor meio bobo pode ser considerado sem graça por alguns, mas está mais próximo da ingenuidade. O choro falso de Chiquinha; a malandragem de Seu Madruga; as bochechas de Quico; o cabelo de Dona Florinda; o sanduíche de presunto; a bola quadrada; a fadiga de Jaiminho e tantas outras coisas, já se tornaram parte da cultura brasileira, embora se trate de uma produção mexicana.
El Chavo del Ocho |
Um dos meus episódios favoritos, sem dúvidas, foi a viagem a Acapulco. Que depois pude descobri que o episódio de Acapulco não teria sido o último gravado com Carlos Vilagrán, intérprete de Quico. Mas sim o último exibido com o personagem. De qualquer maneira, mesmo sem ter certeza, a canção da Boa Vizinhança, cantada em um luau na praia, mantém uma aura quase épica para os fãs da série. Prometendo não se despedirem jamais, e com uma das atmosferas mais amigáveis, o capítulo é absolutamente clássico. Seja pela tristeza inicial de Chaves ao achar que ficaria para trás, ou por seu encantamento com a porta giratória, ao fazer sua primeira grande viagem.
Um dos destaques, sem dúvida, foi finalmente poder vê-los com um figurino diferente dos de sempre. Adaptados com o mesmo quê de simplicidade das roupas do dia a dia, talvez tenha sido um pouco frustrante que Dona Clotilde (interpretada por Angelines Fernández) tenha mantido o mesmo vestido azul, mas nada supera o macacão listrado de Professor Girafales (interpretado por Rubén Aguirre), especialmente quando ele quase se afoga numa piscina com a altura de suas pernas.
Mas além das vestimentas, a mudança de cenário também merece ser mencionada. Chamado por aqui, em algumas dublagens, de Guarujá, o lugar contribuiu para que a história pudesse explorar outras possibilidades, coisa que a vila restringia bastante.
E nesse sentido, também não há como esquecer as tramas passadas no restaurante de Dona Florinda (interpretada por Florinda Meza). Já sem a presença de Seu Madruga (interpretado por Ramón Valdés) no enredo, foi nesse período que Dona Neves parece ter ganhado mais destaque. Ao lado de Seu Jaiminho e sua eterna fadiga, foram muitos momentos que fugiram do formato ‘normal’ da história, mas que no entanto, conseguiram ser tão divertidos quanto possível.
Além desses, vale mencionar também todas as aulas tidas pelos personagens. A escola que abrigava os coadjuvantes Godinez, Pópis, Nhonho e Paty, às vezes, era um pouco complicada de acompanhar, graças a algumas dificuldades de tradução ao pé da letra, contudo, ajudou a consolidar bordões como “que burro, dá zero pra ele“, além de mostrar o lado apaixonadinho do menino, bem como um certo ciúme de Chiquinha (interpretada por María Antonieta de las Nieves). O romance nunca acontecido ou explorado entre os dois amigos sempre foi uma dúvida pra mim. E é falando sentimentalmente que lembro de mais um capítulo inesquecível. Aquele em que Chaves deixa a vila sendo chamado de ladrão. A cena, considerada uma das mais tristes exibidas, é daquelas em que dá vontade de entrar na tevê, e reclamar contra a injustiça. No fim das contas, o responsável pelo crime era o senhor Furtado, que acabou por se redimir no final. Entretanto, ver que todos brigaram com uma criança honesta foi um dos instantes mais dramáticos da série acostumada a fazer rir.
El Chavo del Ocho |
Apesar de ser um programa criado na decada de 70, conseguiu traduzir com louvor dramas sociais com a leveza que uma criança necessita para adquirir opinião própria sobre as questões sociais. Muito mais do que isso, Chaves também despertou sentimento de justiça, de carinho, de cuidado, de preocupação. Eu sou muito fã dessa turma, daqueles de como tantos outros assistiu mil vezes o mesmo episodio e ainda consegue sorrir das trapalhadas da turma. O Chaves, o Kiko, Chiquinha, Dona Florinda, Seu Madruga e toda turma, vivem, e vivem no coração de uma legião de pessoas que adoram esse humor inteligente que eles souberam fazer como ninguém.
Frases como “foi sem querer, querendo“, “conta tudo pra sua mãe“, ou mesmo com o protagonista ‘irmão’, Chapolin, e seu “não contavam com minha astúcia“ fazem parte da cultura popular e caiu na boca do povo.
Se comparada com super produções atuais, seu cenário, figurino e até mesmo roteiro, podem parecer meio bobos, porém, de longe muito mais coerentes do que relógios de mil funções e dramas precoces, que apostam em figuras não tão infantis e às vezes, exageradas demais.
Claro que não dá pra dizer que seja uma obra prima absoluta, livre de falhas, ou mesmo não admitir que tem aspectos super valorizados. O que faz diferença, pelo menos pra mim, é notar que apesar disso, conseguiu sobreviver e narrar histórias que vão além do superficial. Pode ser que durante a infância, dentro de toda atmosfera de inocência do período, não dê pra notar, por exemplo, o quanto a fome e a miséria rondavam aquelas pessoas. Ainda assim, é impossível não celebrar o enredo por tentar imprimir noções de realidades como essa, passeando pela ficção, mas sem se perder apenas no surreal. E principalmente, por não cair da armadilha de ter tornado isso um dramalhão recheado a lágrimas, a não ser aquelas derramadas dentro do barril.
Em tempos em que o politicamente correto reina, é um alento saber que frases como “não se misturar com a gentalha” não soam como nenhuma grande ofensa e que brincar com a tragédia não precisa necessariamente ser algo ruim, especialmente pra quem sabe como fazer isso. E Chaves sabia. E só por isso já merecia todas as comemorações do mundo nesses tantos e tantos anos no ar.
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